terça-feira, 2 de junho de 2020

E não há tempo que volte*

Tema: Karaokê
Por Rafael Freitas

Há vinte anos, eu frequentava assiduamente um bar da minha cidade: a Casa do Compadre Demercindo Brandão. Apenas Casa do Compadre ou "Bar do Gilson", para os mais chegados.

Não noites de sextas-feiras ou sábados, se não havia show ao vivo ou alguma festa temática (saudades festa à fantasia e baile brega), o bar abria com karaokê. E eu adorava. Ia com o namorado, encontrava alguns amigos e amigas lá; gente que eu só encontrava nessas ocasiões, inclusive.

Eu colocava meu nome na lista do karaokê várias vezes. Se não era minha vez, alguém me chamava para um dueto. Uma das meninas que eu só encontrava lá gostava de cantar "Me usa", aquele forrozão, e eu dançava com uma amiga dela.

Quando já fazia um tempo que estávamos ali, as pessoas começando a demonstrar o nível etílico, eu cantava uma música que gostava muito: "Tempos Modernos", do Lulu Santos. E sempre tirava nota 100, ou seja, não podia cantar mais nenhuma depois (!!!). Raríssimas pessoas tiravam nota máxima, se me permitem a modéstia. Ah, lembro de um amigo da minha turma que tirava a mesma nota com uma música do Fábio Júnior! (E que, depois de bêbado, me dava informações indiciosas de que era gay, como se eu - o bar todo? - não soubesse!)

Essas noites estão entre minhas memórias preferidas da adolescência. A diversão, o entendimento da minha sexualidade (e da dos outros, haha), e uma sensação de bem-estar que deve ser o que, hoje, entendo como a sensação de pertencimento a um grupo.

E passados vinte anos, ainda gosto de "Tempos Modernos". Mas quão triste é perceber que não "vejo a vida melhor no futuro" que eu cantava naquela época?

Pode ser a mágoa pelo contexto político e pelas últimas notícias? Pode. Mas é aquela coisa: "o tempo voa, escorre pelas mãos mesmo sem se sentir". Será que estamos vivendo "tudo o que há pra viver"? Será que o meu semelhante está vivendo tudo o que há pra viver?

Ontem eu chorei. Chorei e me senti impotente. Porque eu creio "no amor numa boa, que valha pra qualquer pessoa". E quero estar rodeado de "gente fina, elegante e sincera". Mas se você vier me falar que preconceito não existe, racismo não existe, que as minorias já estão querendo demais, usando como argumento essa história de que a mamata acabou e me chamar de mortadela, serei obrigado a dizer:

_ Cara, o quê?


* Trecho da música "Tempos Modernos, do cantor Lulu Santos.



2 comentários:

  1. O que faço com esse Cara, o quê??? genteeeeeee, tava quais chorando - e olha que tenho o cuore de pedra - e né? Gargalhei com o final. Amo essa canção!!!

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