segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Era uma vez uma mocinha

Tema: Vilão
Por Laura Reis

Ele sabia como aquele relacionamento era importante. Tinha conhecidos que falavam bem do casal. Sabia exatamente há quanto tempo estavam juntos. Estudava as mensagens que trocavam pelas redes sociais, para se inteirar das piadas internas. Passou as férias no mesmo lugar que eles, para sentir como era o clima e ter coisas em comum para aquela futura conversa.

Chegou dezembro e sabia que, era a época do ano que eles ficavam abalados pelo clima. E então ríspidos e, consequentemente, brigavam feio. Notou uma semana completa de ausência de mensagens fofas e decidiu tomar sua atitude.

Esperou que ela saísse do trabalho, apressada como sempre, reclamona como sempre, sentando naquele mesmo banco em que esperava o ônibus apontar a esquina e se sentou do seu lado. “Que dia!”, exclamou sabendo que ela sentiria uma ligação em qualquer reclamação que bradasse. Ela sorriu e ele começou a contar cada detalhe do dia complicado (e inventado), lembrando sempre de colocar observações como cores, trejeitos, pontuações – o fraco da moça era a importância das bobagens.

Depois que o terceiro ônibus passou e ele viu que ela já estava mais tranquila com o próprio dia e sentindo que tinha ali, um grande novo amigo, despediu-se. No dia seguinte, se adicionaram nas redes sociais e ele pode exibir finalmente todo o acervo de músicas, imagens e piadas que sabia, ela gostaria. Dito e feito, quarenta curtidas no mínimo e mais algumas horas de bate-papo. Deu suporte quando ela reclamou do relacionamento de anos, com seus pequenos calos que naquela hora pareciam grandes e insuportáveis. Sugeriu um término, mas logo emendou um “não dá pra acabar algo assim de uma hora pra outra né?”, ao que, no calor da hora e em referência ao Barney, de HIMYM, ela apenas disse “ok, challenge accepted!”.


Agora era a vez a mocinha ser vilã e adicionar mais um término sem motivo à sua longa lista.

terça-feira, 25 de outubro de 2016

O paraíso são os outros*

Tema: Uma foto, um conto
Por Rafael Freitas



Tinha sempre um livro consigo. Nenhuma companhia poderia ser melhor que um bom livro enquanto esperava um ônibus chegar, enquanto viajava de uma cidade para outra ou esperava sua vez no consultório médico.

Não seria diferente quando começou a trabalhar na escola de um bairro afastado: aqueles quarenta minutos até a chegada seriam bem aproveitados. Reparou na colega que também tirava, todos os dias, um livro da bolsa e ia lendo pelo caminho. Porém, com a sutil diferença de que a cada encontro era um livro novo. E ele na meta de um por mês.

Ali na esquina onde esperavam o ônibus, foi se estabelecendo uma rotina: o beijo carinhoso quando se encontravam seguido por atualizações literárias. Começaram as indicações de leitura, os resumos, os livros preferidos... Mas apenas nos dez primeiros minutos de viagem, porque ambos já estavam inquietos, de livros nas mãos.

Passaram até a emprestar livros um para o outro. Eles que amavam seus livros, que amavam o cheiro de livro novo, que julgavam possuir tesouros organizados nas estantes. Ele apresentou para ela seu escritor preferido. Ela apresentou  para ele seu escritor preferido. Que acabou se tornando o escritor preferido dele também. Era ou não era uma bela amizade começando?

Quando ouviu boatos de que a editora responsável por alguns dos livros daquele seu novo escritor preferido iria fechar e andava recolhendo os exemplares das lojas, correu para garantir os seus. Mais algumas joias para seu baú de tesouros.

Seguiu assim: livros novos na estante, amizade nova para a vida. Ouvi dizer que já marcaram até um café. A receita foi preparada por ela.


* Título do livro que aparece aberto na foto, com textos de Valter Hugo Mãe.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

O espelho de mão e a despedida

Tema: Uma foto, um conto
Por Laura Reis


Quase sempre o que se encontrava em seu quarto eram duas portas abertas, espaço livre para as crianças correrem e os presentes todos em cima da cama, ano após ano.

Em algum momento a sobrinha mais curiosa se deu conta de que, apesar de toda aquela liberdade, havia algo que não era tão aberto assim: a gaveta da escrivaninha. Sempre fechada, descobriu aos 15 anos (quando sentiu falta do espelho que sempre estivera ali em cima), que também ficava sempre trancada. Tal qual sua boca ao questionamento do irmão sobre o que ali fazia.

Ano após ano e o espelho sempre em cima da mesa. De vez em quando o pegava para se olhar e fingir pentear os cabelos, como as princesas nos desenhos. Ria, por fazê-lo há tanto tempo e o devolvia à mesa.

Foi num domingo que, ao acordar, recebeu a notícia de que a tia havia falecido. Já estava com a saúde frágil e tinha algum tempo que as festas de aniversário se resumiam a poucos gatos pingados em volta da cama onde antes os presentes ficavam. Agora, era preenchida apenas pela tia e seus causos do passado.

Passaram-se alguns dias quando decidiu visitar aquela casa que só lhe remetia a barulho: primos correndo pra lá e pra cá, tias conversando, família rindo à beça e muitos parabéns seguidos dos melhores doces esperados por um ano inteiro.

Já no quarto, hoje tão vazio quanto qualquer canto dali, não pôde evitar a mesa. Se espantou ao perceber a gaveta semiaberta e a chave que nunca vira, meio posta. Não se aguentou e a abriu completamente. Ali, só o espelho de mão e um bilhete escrito há três semanas

Querida, sei que você virá até aqui quando eu for embora. E sei que vou embora essa noite mesmo. Espero que continue cuidando tão bem desse espelho. Há muito não consigo me ver nele. 

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Saudade documentada

Tema: caixa
Por: Rosana Tibúrcio


Caixa é o objeto inanimado mais serhumaninho que existe, pois carregado de sentimentos. Do pouco caso à alegria... há tudo dentro de uma caixa. 

Há muitas caixas!!!

Tem a caixa preenchida sem muita atenção pelo encaixotador que tá pouco se lixando pra quem receberá o livro, geladeira, joia ou quaisquer presentes, afinal é só mais um dia de trabalho padronizado.
Tem a caixa de calçados utilizada na produção de artesanato ou pra guardar carretéis de linha.
Tem a caixa do eletrodoméstico que graças.a.Deus.chegou.nem.acredito.
Tem a caixa organizadora de sutiãs e calcinhas tudo.muito.bem.arrumadinho.
Tem a caixa dos gatos não.tenho.nem.teria.mas.sei.que.é.fofinha.

E tem a caixa da saudade, aquela em que guardamos fotos especiais, cartões amorosos ou nem tanto, cartas de amor ou despedidas, uma flor murcha, um recibo importante de algo adquirido há anos, fotos 3x4... Aquela caixa que nunca deve ser tocada se houver pressa. Não existe, pra essa caixa, o tal de vou.ali.rapidinho.pegar.um.trem.rapidão.

Ao abrir essa caixa é preciso mais que tempo: é preciso vontade, porque nela a gente encontra muito mais do que o motivo original e isso é sabido. Nela há história de vida: da gente e dos queridos, só dos queridos. Pessoas odiosas não têm espaço nessa caixa. 

Quem não tem uma caixa dessas não tem saudade documentada. Não tem quase nada. Um dó!! Porque saudade é coisa boa; as de dentro de uma caixa, melhor ainda.


Uma linda quinta-feira pra vocês, minhas gentes, pois nas quintas há sempre algo diferente no ar e hoje há saudade numa caixa... 

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

TPF AM

Tema: caixas
Por: Nina Reis



Dentro daquela caixa havia simplesmente tudo, eu disse tudo que ela mais amava. 
Fandangos de presunto, wafer triplo chocolate, saco de pipoca Yoki, sucrilhos, m&m’s, trident rosa, bombons Chocolates Brasil, garrafinhas de coca-cola, pirulito de chiclete, pote de nutela, muitas muitas guloseimas e besteiras que ela ama. Uma caixa recheada de amor, muito amor, mas fora dela, xii ... fora dela apenas o estampado da caixa em tom azul royal e um cartão pregado com fita durex.
Quando ganhou a tal caixa, ela agradeceu, achou tudo incrível e principalmente delicioso.
Esperou a pessoa dar as costas e resolveu naquele instante customizar a caixa. Fez arabescos com cola glitter, colou alguns adesivos e fechou a caixa com uma fita prateada. Deu um laço e passou o cartão por debaixo. 
Agora sim, ela olha para caixa e nem liga muito para o que dentro dela está, ops, liga sim, por que ela ama aquele punhado de besteira.
Mas ela ama também o que fora da caixa está e sabendo que a pessoa não tinha criatividade para tanto, ela foi lá e fez, por que não?
Apenas para satisfazer um desejo ainda maior de olhar para tal caixa com muito mais felicidade.

*TPFAM
Tudo pode ficar ainda melhor

*muitos muitos anos que não coloco meus títulos assim hahahahaa

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Um presente pro futuro, uma caixa bem bonita*

Tema: Caixas
Por Rafael Freitas

Não, não basta escolher um presente: o cuidado com o embrulho é tão importante quanto o seu conteúdo. Caixas, papéis de seda, laços e fitas devem ser escolhidos com o mesmo carinho e com a mesma atenção.

Dependendo das dimensões do presente, pode ser difícil encontrar alguma. Aí existem muitas opções de sacolas de papéis mais reforçados, coloridos, brilhantes. Celofane transparente com papel de seda colorido e um laço de sisal pra arrematar é sempre um bom pedido também.

Mas nada como as caixas. O objeto fica bem acomodado, todo arrumadinho nas folhas de papel de seda branco. E ainda podem ser colocados alguns bombons em volta, muito chique! E depois, caixas são tão bonitas. Quadradas, retangulares, altas, baixas, lisas, estampadas, de papel bem firme, de madeira. São um presente à parte: não é preciso se desfazer delas, desmontá-las e colocá-las embaixo do colchão. Elas podem ajudar na arrumação do guarda-roupa, na decoração da estante ou da bancada do escritório, abrigando muitos lápis de cor, bijuterias, relógios, óculos, fotografias, livros, cartas de amor, memórias.

Eu gosto de caixas. Talvez tenha aprendido com minha mãe que qualquer caixinha já vai guardando, dizendo que é pra guardar os brincos. Que continuam espalhados pelas gavetas. Mas as caixas estão lá.

Gosto de caixas e tenho amigos que gostam de caixas. Um presente de aniversário, ou de Natal, já inicia a saga da procura pelo melhor embrulho. Tudo bem que nem sempre sai do jeito que eu queria. Nem sempre a caixa é a mais bonita. Sem contar que na maioria das vezes o laço fica torto!

Mas aí a caixa cumpre outro papel, o mais importante: boto todo o meu carinho ali dentro. Faço isso para que esses amigos se sintam amados quando virem, no cantinho da gaveta, uma caixa que eu dei. É assim que em sinto quando olho aqui para o lado e vejo, na estante, caixas transbordando carinho e a nossa história.



* Trecho da música Astrolábio, Alexia Bomtempo


segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Mas era feita com muito esmero

Tema: Caixa
Por Laura Reis

Era uma caixa muito engraçada, não tinha tampa não tinha nada. Ninguém podia abrir ela não, porque a caixa tinha laço não. Ninguém podia dar de presente, porque a caixa não tinha enfeite. Ninguém podia guardar nada ali, porque na caixa... Enfim..


Que sua semana seja melhor que isso aqui, hein? Será.


quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Então... tá bonito não!!!

Tema: sinceramente
Por: Rosana Tibúrcio

Eu me casei de óculos porque não me reconhecia sem; não me reconheço ainda. Aliás, favor me deixarem de óculos quietinha lá o meu caixão. E mando sim, mesmo mortinha. Mas não é de morte que quero falar, isso é assunto pra outro post.
Há três anos não pinto mais meus cabelos porque quis assim e sei que a aparência é algo que faz muitas mulheres dependentes. Que fossem só com a delas, né? Mas não...

Há poucos dias vi uma discussão no twitter sobre ser ou não ser livre para fazer o que se quer, para bancar vontades, crenças, desejos. Vários nomes foram citados, dentre eles o de Luana Piovani (nó, na playboy, photoshop...); de Bela Gil (churrasco de melancia, comeu placenta...) e Fernanda Gentil (nossa, com outra e só cinco meses depois de separadazzz).

Eu admiro essas mulheres que bancam suas vontades independente de opinião alheia, eu me admiro porque também banco as minhas vontades. Eu admiro as Belas, as Luanas, as Fernandas. Eu me vejo nelas porque... sinceramente? Penso que assim como eu, elas adorariam usar o carimbo: "caguei pra você que me critica." Na verdade, tenho nada a ver, também, com quem perde tempo criticando comportamento que não interfere a vida deles. Mas né, sinceramente? Que carma ruim essas pessoas carregam. Tá feio, tá bem feio!!!


Uma linda quinta-feira pra todos vocês, meus amores, pois nas quintas há sempre algo diferente no ar e hoje há uma criticazinha ao que todos nós somos, na verdade: críticos da vida alheia. Em maior ou menor grau. Bora melhorar? 

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Como não conquistar um cargo de chefia

Tema: Sinceramente
Por Laura Reis

Tem sempre aquele funcionário que concorda com tudo que todo mundo fala. E por concordar não me refiro a não ter opinião, me refiro a balançar a cabeça verticalmente depois de cada frase que qualquer um fala numa reunião e transformar a linguagem corporal num verdadeiro ruído ensurdecedor.

Tem aquele outro cara que quer ser simpático demais, prestativo demais e sempre te espera. Ele sempre deixa você passar na frente, ele sempre dá bom dia, opa, joia, e aí, tudo bem, mesmo quando esse diálogo nunca funciona ou nunca levou ninguém a uma conversa realmente relevante. Ele segura a porta pra você passar enquanto pergunta como foi o almoço, sendo que vocês só não se viram num intervalo de 30 minutos e enquanto atravessa aquela porta, não há tempo suficiente para contar tudo o que você fez ou não fez nesse prazo. Esse colega pode ser legal, mas pode ser capaz de transformar a educação em incômodo.

Aí tem aquele outro que faz música de tudo o que se fala ao redor, uma palavra solta ganha melodia, uma frase vira uma música inteira, a caneta batuca legal e estalar os dedos é quase como respirar. Quem diria que um dia música não fosse carinho pros seus ouvidos, né?

E ainda tem sempre aquele mais efusivo que te vê uma vez por semana e toda essa uma vez por semana fala “nossa, mas cadê a animação, a alegria”, “cadê o sorriso no rosto?”, “é sexta-feira, você não está feliz?” “ânimo, gente!”. Pois esse, meu amigo... esse colega é capaz de transformar essa coisa linda que é o sorriso em nada mais nada menos que: uma obrigação.


Mas isso é porque ainda não sou chefe desse departamento, viu? Porque no meu mandato, meu querido... No meu mandato...


Ok, não serei eleito.